A Cidade Como Espaço Para o Seu Exercício

Em cinco anos morando em São Paulo, me mudei algumas vezes de casa. Casa, apartamento, sozinha, acompanhada, em bairros e regiões diferentes ainda que próximas. 

Hoje moro no centro, na República. Até agora, o meu lugar favorito - muito embora sinta saudades dos vizinhos das outras casas. 

Voltei de férias no interior, na casa da minha mãe, e lá caminhamos todos os dias no pequeno parque que tem perto, fica em volta de um regato. Gostoso que só, calmo, com pessoas tranquilas, todos conhecidos, árvores frutíferas, crianças livres, papos engraçados no ar, uma delícia essa atmosfera. 

A República é ótima pro meu itinerário cotidiano, tem ciclovia saindo de casa, ponto de ônibus na porta, metrô a uma quadra, e é o centro! Centro é sempre massa. Para trabalhar, estudar, encontrar os amigos, fica fácil, mas as praças aqui não são bem aquele tipo de praça que parece um cenário bom pra fotos, pra cheirar flores, sentar num banco e contemplar. É passagem, ocupação de feira, sala-quarto-cozinha de muitos.

No centro fica explícito o nosso maior problema brasileiro, a desigualdade social, que habita as praças, os bancos, as calçadas, as ruas, as fachadas. 

Como já dizia o Cidade Ativa, grupo super presente nas questões urbanas, não se faz boa cidade apenas com praças, e os moradores dela não deixam dúvida sobre isso. 

Hoje foi a primeira vez que essa parte da cidade foi meu espaço para exercício, a caminhada que vinha fazendo com minha mãe, e faz comigo a transição do fim das férias para o retorno ao trabalho. 
Nessa mesma vizinhança tão falada, comentada, perigosa, de impressões controversas sobre os moradores de rua, as prostitutas sempre presentes, é possível levar muitos modos de vida, sem ignorar suas características, e sem glamourizar as dificuldades. 

Bem, é claro que isso tudo podia ser melhor, que a praça e as ruas podiam ser conservadas, mas não apenas por remover os moradores de rua e seus fragmentos de casa, a sujeira que acumula, mas por serem vistos, reconhecidos, politica e socialmente. Qualidade de vida é isso, amplo, é o bem estar geral, não só exercícios e uma alimentação bacana. O meu cenário para caminhada e a minha necessidade diária de atividade física fica pequena perto da dimensão desses problemas sociais, mas tem espaço pra ela. Essa cidade tem muito espaço para nós todos. 
 

Que possamos fazer um bom uso dele nesse novo ano, e que ganhe espaço quem não tem.